Se nada der certo no meu projeto

Há dois anos, decidi mudar. Comecei a perceber a necessidade de fazer mudanças no meu estilo de vida e no meu trabalho. Apesar de ser bem remunerada e trabalhar no que gosto, senti que queria mais do que estava obtendo e estava oferendo menos do que desejava. Queria mais qualidade de vida, mudar de cidade, oportunidade de estudar, além de oferecer alternativas para os jovens que buscam o nosso serviço (principalmente vestibulandos e concurseiros).

Para isso, mudanças começaram a ser implementadas: reduzir os horários no consultório, que eram, até então, full time, e consequentemente, aceitar viver com menos. Em relação ao trabalho, tiramos o foco das consultas individuais para escrever livros e cursos, buscando formas de estimular a autonomia dos alunos na sua preparação para as provas. Incluímos o treinamento cerebral de Neurofeedback aos atendimentos presenciais, para auxiliar no desenvolvimento das competências autorregulatórias.

Alguns resultados já foram alcançados em equipe: um livro impresso, dois eBooks, um curso de Gerenciamento da Força de Vontade com algumas edições presenciais e uma edição virtual “no forno”. Claro, sabemos que é somente o começo de uma longa caminhada. Obviamente, todas essas mudanças têm custos – além do financeiro, tem o custo psicológico de se esforçar para mudar e manter a proposta.

O que tem sido necessário para manter a decisão de levar adiante as mudanças?

Em primeiro lugar, a coerência: colocar em prática o que ensino e aprendo no cotidiano da prática psicológica, quando ajudo os alunos a enfrentar os seus desafios, por exemplo:

– o autogerenciamento da força de vontade;

– identificar as competências que precisavam ser aprimoradas;

– reconhecer as competências já desenvolvidas que podem ser melhor aproveitadas;

– manter a saúde física e a psicológica através de pausas programadas para o lazer;

– sair da zona de conforto e fazer, apesar do medo;

– dispor-se a pagar o preço, antes de ter benefícios garantidos;

– ter flexibilidade e paciência, compreendendo que os desafios que envolvem a força de vontade exigem tempo;

– viver na prática o verdadeiro objetivo de gerenciar a força de vontade ( aprendi com Roy Baumeister e confirmei na minha experiência): parar de focar na produtividade e focar no propósito de vida, nos meus valores e na contribuição possível a um número maior de alunos. Focar somente no aumento da produtividade pode levar a um automatismo, à falta de criatividade, de reflexão e de espaço para inovações.

Durante todos esses anos, sempre coloquei em prática as técnicas e estratégias estudadas antes de propor aos alunos. Os pesquisadores das áreas de neurociências, da aprendizagem, da força de vontade, sugerem muitas técnicas. Mas como funcionam na prática? Quais são as dificuldades, facilidades e benefícios ao adotá-las? O trabalho foi construído com muito estudo teórico, mas principalmente com a prática pessoal e no atendimento de centenas de alunos durante 21 anos. Mas sempre tem uma pergunta que não quer calar em qualquer projeto de vida: e se nada der certo? No caso dos alunos, temos que perguntar: e se você não alcançar a aprovação no vestibular?

Esse questionamento exige uma reflexão profunda. É importante evitar levá-lo para o lado lúdico, sem criticidade, como aconteceu recentemente em escolas de nosso Estado. Trabalhamos com os alunos algumas ideias que podem ser exploradas em qualquer ambiente escolar ou mesmo pelos pais em casa. Também são válidas para mim, quando avalio o andamento do meu projeto:

– Fazer uma autocrítica sincera: o que eu preciso melhorar para alcançar o meu objetivo? Preciso desenvolver alguma competência? Posso aproveitar melhor alguma habilidade “esquecida”?

– Eu sei estudar? Posso melhorar o meu método ou minha rotina de estudos?

– Existem vícios – redes sociais, Netflix – que me levam à procrastinação? Como posso minimizar esse prejuízo?

– Consigo reconhecer que não existe sucesso fácil? Estou consciente do esforço necessário para fazer algo que realmente vale a pena?

– As minhas metas precisam ser revistas?

– Um plano B pode ser útil? Qual?

Engagar-se em um trabalho voluntário, também pode ser uma boa opção em caso de insucesso no vestibular. O jovem pode repensar sua escolha, conhecer outras realidades, compreender melhor o mundo em que vive.

Lembrar que um ano de aprendizagens e enfrentamentos é bem aproveitado independente do resultado alcançado: é preciso valorizar o esforço e a caminhada, e menos o resultado. Aqui, entra a capacidade de aprender com os erros, com os “fracassos”, com a capacidade de começar com pequenas tarefas humildemente. Existem muitos exemplos disponíveis, atuais e que nos inspiram e podem interessar aos jovens.

Cabe aos pais e professores ajudar os alunos com esse tipo de exemplo, que sempre existiu, mas que atualmente estão disponíveis nas redes. Todos nós lemos os exemplos de pessoas que superaram dificuldades, aprenderam com os erros, enfrentaram situações chamadas de “fracasso”. Você, eu, e muitas pessoas que conhecemos já passaram por isso e talvez essa seja a razão que nos permite repensar o rumo que a vida está tomando… e mudar. Aprendemos que tropeços acabam se tornando degraus para aqueles que aprenderam que a realização de um projeto de vida não é linear, é construído a partir de uma caminhada com muito suor, esforço, trabalho, persistência e por que não dizer… erros!

Depois de algumas vivências, compreendemos que não existe “nada” dar certo em qualquer empreendimento. Não existe a possibilidade de empreender, arriscar, ter coragem e sair incólume desse movimento: existe sempre o crescimento pessoal, as marcas positivas das superações. Retomando à polêmica dos jovens gaúchos, sinto que faltou proporcionar essa reflexão aos jovens: se você não alcançar o seu objetivo, o que você aprendeu? O que leva da sua experiência?

E você, leitor? O que leva da experiência que está tendo da sua vida atual?